Caso Elias Rassi Neto

Você significa uma ideia a ser destruída

O Dr. Elias Rassi Neto dedicou sua vida à saúde. Nasceu em Anápolis (GO) e cedo se mudou para Goiânia (GO) para estudar. Tendo ingressado na faculdade de Medicina no ano de 1974, participou da reconstrução do Centro Acadêmico e foi vice-presidente do Diretório Central dos Estudantes. Presidiu diversas entidades, como a Associação dos Profissionais de Saúde Pública de Goiás; foi vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva por dois mandatos; presidiu o 11º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva; foi coordenador-geral do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva da UFG e; membro do Conselho Nacional de Saúde, presidiu o Conselho Estadual de Secretarias Municipais de Saúde, dentre tantas outras representações eletivas.

 

Montou a primeira Regional de Saúde, abarcando 23 municípios e a capital, Goiânia. Eleito vereador em Goiânia, foi presidente da Câmara de Vereadores e, posteriormente, reeleito vereador.

 

No período de 1997 a 2000, foi Secretário Municipal de Saúde de Goiânia. Municipalizou a saúde da cidade quando foram implantadas quase oitenta equipes do Programa Saúde da Família. Construiu a maternidade “Nascer Cidadão”, referência estadual e nacional de atenção à mulher e à criança, transformando profundamente paradigmas de atenção à primeira gestação.

 

Foi diretor técnico de planejamento do Ministério da Saúde. Voltou a exercer o cargo de Secretário de Saúde Municipal no período de 2011 a 2012.

Saúde pública versus saúde privada

No ano de 2011, a sanha da Lava Jato se irradiou para o Brasil inteiro, chegando também a Goiânia. Como Secretário Municipal de Saúde, Rassi teve que enfrentar sérios problemas com o Conselho Regional de Medicina, tendo respondido a 25 sindicâncias, todas arquivadas por absoluta improcedência. Enfrentou, ainda diversos problemas com membros do Ministério Público. E aí está a origem do caso.

 

Elias relata que chegou a receber ameaças de um promotor dentro do seu gabinete:

“Me ameaçou de perseguição política. Ele me intimou a ir lá, por uma outra razão: estávamos reconstruindo a maternidade Dona Iris e ele queria que a gente mudasse o nome da maternidade. Na verdade, eu entendo que ele não queria mudar o nome. Ele queria interferir no processo político, bloqueando a reconstrução da maternidade. Era véspera da eleição e a maternidade tinha um peso muito grande. Eu me recusei, obviamente, argumentando que não fazia o menor sentido. Já era um nome de 50 anos. Argumentei que quem denomina prédios públicos era a Câmara Municipal. Ele me ameaçou de perseguição política. Ingressou na justiça, tentando impor mudança de nome”.

A visita ao gabinete do promotor terminou com a ameaça fatal: “Daqui a pouco você não será mais secretário e esta estrutura [do MP/GO] que está ao meu redor é só para tocar processos”. 

 

Ao todo somam 1.426 ações judiciais e extrajudiciais. Só no Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM) foram abertos mais de 1.200 processos. Estes processos geraram oitenta multas. Foi condenado a devolver o valor integral da reforma da Maternidade Dona Íris, R$ 18.000.000,00. Somando-se todos os processos, os valores corrigidos alcançam a casa dos R$ 200.000.000,00. 

 

Como alguém pode se defender de 1.426 processos? Como pagar R$ 200 milhões, quando se é um professor universitário que recebe um salário líquido de R$ 5.000,00?

 

De início, os advogados não conseguiram acesso aos processos para fazer a defesa. Somente depois de um ano de peregrinação tiveram acesso a uma parte ínfima dos processos no Tribunal de Contas. Curioso é notar que apenas um analista deu pareceres na quase totalidade de tais processos.

 

No período de um ano e meio, como Secretário de Saúde, recebeu resmas e mais resmas de papéis, de notificações judiciais e extrajudiciais. Foram 2.834 ofícios do Ministério Público de Goiás. A média diária era de oito notificações que o órgão exigia fossem respondidas. 

 

O Gaeco chegou a fazer uma operação de busca e apreensão na Secretaria de Saúde. Foram com metralhadoras buscar documentos que já haviam sido comprovadamente entregues ao órgão, um mês antes da realização da grotesca operação. O Gaeco sequer se desculpou do erro que cometeram. 

 

Dois Inquéritos Civis Públicos (ICPs) foram instaurados no Ministério Público Federal de Goiás (MPF/GO). Outros setenta ICPs no Ministério Público de Goiás (MP/GO).

 

Um desses inquéritos, apesar de arquivado pelo Conselho Superior do MP/GO, gerou um processo judicial para cobrança de valor de 36 milhões, ação de execução fiscal na Vara da Fazenda Pública Municipal.

 

Um dos inquéritos no MPF se iniciou com uma denúncia assinada por uma pessoa que não existia, com um CPF falso.

 

O método usado pelos promotores de Justiça de Goiânia foi, claramente, atacar sempre e de qualquer forma. Se de um jeito não era possível atacar Elias, buscava-se outra maneira. No caso, se um inquérito fosse considerado improcedente e, assim, arquivado, os promotores voltavam à carga com outra denúncia, repetindo os mesmos objetos e fundamentos para abrir processos judiciais de cobrança.

 

O MP ajuizou dez processos judiciais na Justiça Estadual de Goiás contra o médico e professor, Elias Rassi. Entre eles, uma ação de cobrança do valor de R$ 12.900.000,00; uma ação civil no valor de mais de R$ 35.000.000,00; outra no valor de R$ 24.000.000,00. Nessa última, o pedido de ressarcimento ao erário é o valor equivalente a seis vezes o valor do contrato que estava sub judice e que se referia à manutenção de ambulâncias.

 

Além dos processos de cobrança de valores nas varas da Fazenda Pública Municipal da Comarca de Goiânia; dos processos cíveis na Justiça Federal de Goiás, Elias teve que enfrentar ações penais: uma na Justiça Estadual de Goiás e doze no Juizado Especial. Embora todas as ações penais tenham sido julgadas e arquivadas, o que chama a atenção é a quantidade de processos movidos contra sua pessoa. 

 

Que pessoa consegue enfrentar essa avalanche de processos judiciais?  E o custo disso, para o bolso de Elias e para a sua vida pessoal e profissional? 

 

Elias foi acusado de improbidade porque se recusou a mudar o nome da Maternidade “Dona Íris”. Esse nome era usado há cinquenta anos. A lei a que se recorreu no caso: a improbidade, implica desonestidade, pressupõe agir de má fé, com dolo e usar o recurso público para enriquecimento próprio ou de terceiros. Inaugurar uma maternidade com o nome de “Dona Íris” não poderia jamais significar que o acusado teria que devolver R$ 18.000.000,0 aos cofres públicos.

 

A perseguição judicial não se contenta em massacrar as pessoas somente no papel, somente nos autos. O lawfare conta com a mídia para transformar o pretenso inimigo de um em inimigo de todos, de toda a sociedade. 

 

No caso de Elias, foram publicadas mais de duzentas matérias, quase todas originadas em declarações e releases fornecidos pelos membros do Ministério Público de Goiás. Ou seja, Elias foi exposto para a sociedade, como “inimigo” que é a versão estabelecida pelo promotor que, dentro de seu gabinete, ameaçou Elias de perseguição.

Vida interrompida

Elias, que estava cursando o doutorado, teve que abandonar o curso. Atualmente, é obrigado a acompanhar, diariamente, os quinze processos que ainda estão ativos. Foi obrigado a deixar de pagar as parcelas das multas impostas pelo TCM no valor de R$ 5.000,00, pois tal valor equivale ao valor líquido do salário que recebe como professor universitário.

“Temos a ideia de que a Justiça é justa e isto não é verdade. Quando a Justiça acusa, a pessoa fica marcada. Acusar pessoas sem fundamento é crime”, afirma Osmar Pires Martins Júnior, autor do livro “Lawfare em Debate”.

Dimensões do lawfare no caso Elias

Geográfica – No caso do Elias, os 1.200 processos se originaram no Tribunal de Contas dos Municípios. No TCM, os processos tramitaram administrativamente. Lá, montaram a acusação, julgaram e condenaram, sem ouvir a outra parte, pois defender-se dessa avalanche de processos é impossível, o que caracteriza absoluto e profundo cerceamento de defesa.

 

Leis – no caso de Rassi, verifica-se o uso de falsos fundamentos. Ele foi acusado de improbidade, porque teria inaugurado a maternidade com o nome “Dona Íris”. Recorreram ao uso de um princípio administrativo, o da impessoalidade. O princípio, de forma alguma se aplica ao caso. Dar o nome de uma pessoa para prédios públicos não caracteriza improbidade, nem fere o princípio da impessoalidade. Além disso, o nome à maternidade já havia sido dado há cinquenta anos.

 

Improbidade é desonestidade; pressupõe agir de má fé, com dolo, usar o recurso público para enriquecimento próprio ou de terceiros. 

 

Externalidades – sem mídia não existe lawfare. O caso foi largamente explorado pela mídia local. Foram mais de duzentas matérias, quase todas originadas em declarações e releases fornecidos por membros do Ministério Público de Goiás.